Quando criança, eu roubava pequenos objetos idiotas das pessoas. Desculpe mãe, eu não sabia o que fazia. Mas sabia o que fazia sem saber. Roubava os objetos para inventar uma outra vida pra mim.
Enquanto vestia o objeto, como roupa, me transformava noutra. Experimentava a exterioridade de não ser eu. De um tio, roubei o encarte de um cd, no natal. Roubei um óculos de uma professora de inglês. Roubei uma borrachinha de cabelo de uma amiga rica da escola. Fui, temporariamente, todas as histórias que inventei enquanto tinha esses objetos comigo.
Mas, depois, eu tinha que devolver e não conseguia. Minha mãe descobria e danava comigo. Chorava, queria entender o motivo. Eu não sabia explicar. Só sabia que precisava. Precisava ser outra. Precisava inventar-me outra para suportar aquela vida. Eu só tinha 9 anos. 11 anos. 13 anos. 15 anos. Ai parei de roubar. Parei de criar histórias inventadas com pequenos objetos de valor da vida das pessoas.
A minha barriga cresceu e eu estava perdida pra sempre. Não daria mais para ser outra. O relógio começou a bater e minha morte já estava em andamento. A roubada fui eu.
Para citar o texto: ACCIOLY, A. (2024) Roubo. Em: www.alineaccioly.com.br
