Uma madrugada,
Uma cama,
Uma mulher,
Um quarto escuro.
Temos a cena, a personagem e o enredo.
Sim, tudo se passa na angústia da calada da noite. Nada mais simples e mais aterrorizante.
Na rua, apenas o som do silêncio cortado pelos gritos de um bêbado que atravessa o bairro. De tempos em tempos, escuta-se também o barulho de sons de carros passando. No mais, o intenso som do silêncio.
A mulher revira-se de um lado para o outro, esperando ansiosamente pela vinda do sono. Já são três semanas consecutivas sem conseguir dormir profundamente. Na primeira, culpou a correria da escrita de um artigo; na segunda, culpou o mal estar de viagem por dormir fora de casa e da sua cama; na terceira, em acontecimento, desculpas não enganam mais. A angústia não engana.
Talvez a paixão não lhe caiba bem. Enrolando de um lado para o outro, acredita que estaria melhor fora de uma relação, tendo que lidar apenas com as angústias particulares. Mas logo se dá conta de sua falaciosa verdade, visto que essa angústia que sente nunca é do outro, é sempre sua e nada mais.
Tudo parece que vai bem em sua vida, no entanto nunca esteve tão inquieta. Um aperto em seu peito e os constantes olhos irritados são a prova no corpo de que algo insiste em não aquietar. Enquanto não conseguir nomear seu mal estar, sabe que não conseguirá se entregar aos braços de Morfeu nas noites seguintes.
Na noite anterior, achou que estava enlouquecendo e escreveu um poema sobre a arte de endoidecer. Mas hoje parece sentir que nunca esteve tão sã, tão perto de sacar seu próprio funcionamento emocional.
Talvez seja angústia por saber. Deseja sempre saber, ter controle sobre as pequenas grandes coisas da vida. Quanto mais incerteza sente, mais controladora e necessitada de saber ela fica. Adoece, inquieta, desejosa de garantias que nunca aparecem.
Nada mais aterrorizante do que uma mulher sozinha em uma madrugada, tendo que enfrentar sua própria angústia avassaladora. Sente saudade dos seus terrores juvenis, como o medo de fantasmas e monstros. Enquanto lembra com nostalgia de sua inocência perdida, uma lagrima escorre tímida pelo seu rosto.
Dessa vez, não há um herói para salva-la de si mesma. A verdade é que nunca existiu salvação de si. Terá que enfrentar sozinha o aperto no peito que insiste em aparecer todas as noites, na luta contra o próprio corpo.
Viver intensamente é para poucos. Viver custa a própria vida e a sanidade. Quanto mais o tempo passa, mas sério fica.
Para citar o texto: ACCIOLY, A. (2024) Notívaga. Em: www.alineaccioly.com.br
