Inicialmente supus que criaria uma regra para usar “nosso” tempo convertendo-o em prática de escrita. Mal terminei o pensamento e já me flagrei sorrindo. Essa história de regra é uma grande bobagem moralizante. A ética do desejo não se verte à moral, precisa manter-se como exercício para permanecer em constante combustão. Na primeira semana caminhando com sua ausência, preenchi os horários com trabalho. Antes de entristecer, achando que havia começado mal, lembrei ter marcado uma reunião de orientação no horário que era nosso. Passei aquela hora, que para nós não passava de intensos e ofegantes vinte minutos, orientando uma pessoa desconhecida, cujo tema de pesquisa adivinha qual era? Escrita. O sorriso ganhou espaço no meu rosto mais uma vez. Lá estava eu caindo nos descaminhos do desejo. Flagrei-me usando o tempo com escrita. Tentei dar a volta em mim mesma e acabei encontrando-me, mais uma vez, no exato lugar da escrita. Não que eu duvidasse da marca, mas o corpo não mais se pensa para imprimi-la. Passo a passo, apenas escreve, entre traços.
Para citar o texto: ACCIOLY, A. (2024) Carta 02. Em: www.alineaccioly.com.br
